A comissão mista que analisa a
medida provisória (MP) 881/2019 aprovou
nesta quinta-feira (11) o relatório do deputado Jeronimo Goergen (PP-RS). O
texto estabelece garantias para o livre mercado, prevê imunidade burocrática
para startups e extingue o Fundo Soberano do Brasil. O projeto de lei
de conversão (aprovado quando uma MP é modificada no Congresso) precisa passar
pelos Plenários da Câmara e do Senado antes de ir para a sanção do presidente
da República. A comissão mista é presidida pelo senador Dário Berger (MDB-SC).
A medida provisória institui a
Declaração de Direitos de Liberdade Econômica. De acordo com o Poder Executivo,
o texto tem como objetivos recuperar a economia, garantir investimentos em
educação e tecnologia, possibilitar a desestatização e resolver questões
concretas de segurança jurídica.
A MP 881/2019 libera pessoas
físicas e empresas para desenvolver negócios considerados de baixo risco.
Estados, Distrito Federal e municípios devem definir quais atividades
econômicas poderão contar com a dispensa total de atos de liberação como
licenças, autorizações, inscrições, registros ou alvarás. De acordo com o
texto, essas atividades econômicas poderão ser desenvolvidas em qualquer
horário ou dia da semana, desde que respeitem normas de direito de vizinhança,
não causem danos ao meio ambiente, não gerem poluição sonora e não perturbem o
sossego da população.
De acordo com o texto, a
administração pública deve cumprir prazos para responder aos pedidos de
autorização feitos pelos cidadãos. Caso o prazo máximo informado no momento da
solicitação não seja respeitado, a aprovação do pedido será tácita. Cada órgão
definirá individualmente seus prazos, limitados ao que for estabelecido em
decreto presidencial. A MP também equipara documentos em meio digital a
documentos físicos, tanto para comprovação de direitos quanto para realização
de atos públicos.
A MP 881/2019 prevê imunidade
burocrática para o desenvolvimento de novos produtos e serviços e para a
criação de startups — empresas em estágio inicial que buscam
inovação. Poderão ser realizados testes para grupos privados e restritos, desde
que não se coloque em risco a saúde ou a segurança pública. O texto também
autoriza que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) reduza exigências para
permitir a entrada dos pequenos e médios empreendedores no mercado de capitais.
A ideia é que empresas brasileiras não precisem abrir seu capital no exterior,
onde encontram menos burocracia.
A matéria extingue o Fundo
Soberano do Brasil (FSB), criado em 2008 como uma espécie de poupança para
tempos de crise. Os recursos hoje depositados no FSB serão direcionados ao
Tesouro Nacional. O ex-presidente Michel Temer já havia tentado extinguir o FSB
por meio da MP 830/2018, mas o dispositivo foi rejeitado no Parlamento. Em maio
de 2018, o patrimônio do fundo somava R$ 27 bilhões.
Fim do eSocial
A MP 881/2019 recebeu 301
emendas. O deputado Jeronimo Goergen acolheu 126 delas, integral ou
parcialmente. O relator incluiu um dispositivo para acabar com o Sistema de
Escrituração Digital das Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas
(eSocial). O sistema tem como objetivo unificar o pagamento de obrigações
fiscais, previdenciárias e trabalhistas.
Para Goergen, “as empresas estão
sendo obrigadas a fazer um enorme investimento” para atender ao eSocial. Mas
não são dispensadas de outras obrigações como a Declaração do Imposto de Renda
Retido na Fonte (Dirf), a Relação Anual de Informações Sociais (Rais), o
Sistema Empresa de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social
(Sefip) e o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).
O texto prevê ainda a prevalência
do contrato sobre o direito empresarial em situações de insegurança jurídica e
formas alternativas de solução de conflito em sociedades anônimas. Em outra
frente, o relator sugere a criação dos chamados sandboxes — áreas
sujeitas a regimes jurídicos diferenciados, como zonas francas não-tributárias
definidas por estados e Distrito Federal.
Transportadoras
A MP 881/2019 anistia multas
aplicadas a transportadoras que descumpriram a primeira tabela de frete fixada
pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), em 2018. O deputado
Jeronimo Goergen prevê ainda a criação do Documento Eletrônico de Transporte
(DT-e) para eliminar 13 dos 30 documentos associados às operações de
transportes de cargas e de passageiros no Brasil.
O texto prevê autonomia privada
nos contratos agrários, atualmente regulados pelo Estatuto da Terra (Lei 4.504, de 1964).
Para o relator, “o dirigismo estatal tira das partes a livre manifestação de
vontade e cria restrições no uso da propriedade”. Jeronimo Goergen propõe ainda
a extinção do livro caixa digital para produtores rurais, o que ele classifica
como “uma burocracia desnecessária”. O relator também incluiu no texto medidas
para desburocratizar a liberação do financiamento de imóveis.
Legislação trabalhista
A MP 881/2019 altera diversos
pontos da Consolidação das Leis do Trabalho (Decreto-Lei
5.452, de 1943). O texto prevê, por exemplo, que a legislação trabalhista
só será aplicada em benefício de empregados que recebam até 30 salários
mínimos. A medida provisória também prevê a adoção da carteira de trabalho
digital e autoriza o trabalho aos domingos e feriados, sem necessidade de
permissão prévia do poder público. Por fim, a matéria acaba com a
obrigatoriedade das Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (Cipas) em
situações específicas. O deputado Enio Verri (PT-PR) criticou esses pontos do
texto.
— Não creio que o liberalismo
econômico seja a saída para as grandes crises que vivemos. O incentivo a micro
e pequenas empresas sem dúvida é um avanço. Mas a medida provisória faz uma
nova reforma trabalhista. Na verdade, tira-se mais direitos. Eu não entendo
como a micro e a pequena empresa vão crescer com uma população desempregada e
sem salário. Quem vai comprar da micro e pequena empresa? — questiona Verri.
O relator da matéria disse que é
“inteiramente falso” o entendimento de que a liberdade econômica reduz
direitos. Para Jeronimo Goergen, a MP 881/2019 não ameaça os trabalhadores.
— O Estado deve abrir caminho
para as liberdades econômicas e a iniciativa privada, sem que isso signifique
receio à proteção de direitos coletivos, difusos e individuais homogêneos. É,
ao contrário, o aumento da proteção às liberdades econômicas, à livre
iniciativa. É plenamente possível um jogo de ganha-ganha, em favor tanto das
liberdades econômicas como da manutenção do atual nível de proteção. A medida
provisória aumenta a proteção às liberdades econômicas às custas do
agigantamento do Estado — disse.
A medida provisória perde a
validade no dia 10 de setembro, caso não seja votada pelas duas Casas do
Congresso até essa data.
Fonte: Agência Senado