Advogada
Natália Rossi, membro das Comissões Notariais e
Registrais, Família e Sucessões e Negócios Imobiliários do IBRADIM, analisa
impactos, benefícios e desafios da desjudicialização desse processo em
entrevista ao CNB/RS
A Resolução 571/2024 do
Conselho Nacional de Justiça (CNJ) trouxe avanços para a celeridade dos
inventários extrajudiciais nos casos que envolvem menores ou incapazes. Em
entrevista ao Colégio Notarial do Brasil – Seção Rio Grande do Sul (CNB/RS), a
advogada Natália Rossi, membro das Comissões Notariais e
Registrais, Família e Sucessões e Negócios Imobiliários do Instituto Brasileiro
de Direito Imobiliário (IBRADIM), explica como a medida beneficia as famílias,
as salvaguardas legais para proteger esses herdeiros e os possíveis desafios da
desjudicialização.
Confira os detalhes
abaixo:
CNB/RS - Como a Resolução
571/2024 do CNJ impacta a celeridade dos processos de inventário, especialmente
nos casos que envolvem menores ou incapazes, e quais são os benefícios práticos
para as famílias?
Natália Rossi -
Desde o advento da Lei 11.441/07 intensificou-se o movimento de
desjudicialização no Brasil, permitindo que inventários, partilhas, separações
e divórcios fossem realizados extrajudicialmente nos Tabelionatos de Notas,
deixando para o Judiciário questões mais complexas e litigiosas.
Quando a via judicial era
a única opção, mesmo aqueles inventários sem qualquer litígio familiar, se
tornavam verdadeiros motivos de angústia, em razão da burocracia processual,
lentidão e uma série de despesas associadas aos procedimentos judiciais. A alta
demanda do poder judiciário antes da Lei, fazia com que Inventários e partilhas
mais simples demorassem anos para findarem, impactando significativamente nos
valores dos bens inventariados, na utilização dos bens pelos herdeiros, bem
como na experiência desgastante dos envolvidos.
Fato é que antes da
Resolução 571/2024, alguns requisitos legais exigidos para que as famílias
pudessem solucionar situações patrimoniais sem recorrer ao Judiciário tornavam
a via extrajudicial, por vezes, restrita, como é o caso dos inventários que
envolviam menores ou incapazes. A grande preocupação era garantir a proteção
integral das pessoas em situação de vulnerabilidade, na qual há necessidade de
intervenção do Ministério Público.
Pois bem. A Resolução
571/2024 que normatiza, a nível nacional, questões já praticadas em alguns
estados, que é a possibilidade dos inventários e partilhas extrajudiciais com
herdeiros menores ou incapazes, foi cautelosa ao considerar o principal entrave
à via extrajudicial, exigindo, assim, a manifestação favorável do Ministério
público, bem como impondo alguns requisitos específicos para garantir o rigor
protetivo do patrimônio do menor ou incapaz.
Destarte, a realização desses inventários extrajudicialmente, ainda que haja necessidade de manifestação favorável do MP, torna mais célere e efetiva a partilha dos bens, conservando a segurança jurídica e a proteção patrimonial dos herdeiros menores ou incapazes. Sem dúvidas, um grande avanço jurídico.
CNB/RS - Quais são as
principais salvaguardas legais previstas na Resolução 571/2024 para garantir a
segurança jurídica dos inventários extrajudiciais com menores ou incapazes, e
como elas se comparam aos procedimentos judiciais tradicionais?
Natália Rossi -
A Resolução 571/2024 impôs algumas exigências a serem cumpridas, a fim de
possibilitar a lavratura dos inventários ou partilhas por escritura pública com
herdeiro menor ou incapaz, são elas: (i) a necessidade de que a partilha e o
pagamento do quinhão hereditário ou da meação do herdeiro menor ou incapaz
ocorra em parte ideal em cada um dos bens inventariados, de modo que os
herdeiros fiquem em condomínio sobre os bens; e (ii) manifestação favorável do
Ministério Público.
Além disso, não é
possível qualquer ato de disposição relativos aos bens e direitos do
interessado menor ou incapaz.
No procedimento judicial
não há esse rigor na partilha em parte ideal, bem como é possível que o juiz,
na análise do caso concreto, autorize a venda de determinados bens para
pagamento das despesas do inventário, desde que verificado que o melhor interesse
do menor ou incapaz foi preservado.
Portanto, para realização
de partilhas, nas quais são atribuídas a integralidade de um determinado bem em
pagamento do quinhão ou da meação de um herdeiro, partilhas desiguais, ou que
haja qualquer ato de disposição de um bem ou direito do menor ou incapaz, a via
judicial se faz necessária.
Em ambos os
procedimentos, judicial ou extrajudicial, haverá necessidade de intervenção do
Ministério Público quando envolver herdeiro menor ou incapaz. Contudo, o
trâmite processual e prazos dos inventários judiciais são por essência mais
extensos em comparação aos inventários extrajudiciais, que podem ser
finalizados em semanas.
Por essa razão, a via
extrajudicial se torna cada vez mais atrativa para os herdeiros que buscam
usufruir dos bens deixados pelo falecido de forma rápida, segura e efetiva.
CNB/RS - Na sua
avaliação, quais são os possíveis desafios associados à desjudicialização dos
inventários com menores ou incapazes, e como os advogados podem atuar para
garantir que os direitos desses herdeiros sejam preservados?
Natália Rossi -
O principal desafio, a meu ver, é operacionalizar e padronizar a atuação do
Ministério Público em todos os estados brasileiros. Em 12 de novembro de 2024
foi editada a resolução nº 301 do Conselho Nacional do Ministério Público
prevendo expressamente, em âmbito nacional, que a comunicação entre as
serventias extrajudiciais e as unidades do Ministério Público será realizada
por meio eletrônico e imponto inclusive prazos para o trâmite do procedimento,
resguardando assim a celeridade inerente ao extrajudicial.
Antes mesmo da edição
dessa resolução, o Ministério Público do estado de São Paulo já havia se
manifestado editando a RESOLUÇÃO Nº 1.919/2024-PGJ-CGMP, de 18 de setembro de
2024, sendo pioneiro na disponibilização de um sistema totalmente online que
permite essa integração entre os tabelionatos de notas paulistas e o Ministério
Público. O sistema passou a ser operacionalizado a partir de 1 de março de
2025, permitindo aos tabelionatos de notas o envio, de forma totalmente online
e facilitada, da minuta e dos documentos necessários para início do
procedimento no órgão ministerial.
Em outros estados, porém,
a exemplo do Rio Grande do Sul, há uma certa resistência por parte do
Ministério Público em aceitar referida normatização, inviabilizando assim o
procedimento via extrajudicial.
Como tudo que é novo no
meio jurídico, muitas propostas são feitas para aprimorar e desburocratizar
esse procedimento. Questões relevantes são discutidas no meio acadêmico, como a
possibilidade de lavratura de escrituras públicas de nomeação de inventariante,
quando há herdeiro menor ou incapaz, com poderes estritamente administrativos,
para busca de informações de bens e extratos bancários do falecido, sem que
haja qualquer ato de disposição de bem do espólio, independentemente de
manifestação do MP, fazendo apenas uma comunicação posterior ao órgão
ministerial.
Como advogada vejo um que
essas alterações serão muito bem recebidas pelos interessados nos inventários e
partilhas. Isso porque quando apresentado aos clientes um comparativo entre a
via extrajudicial e a via judicial e a economia de tempo e financeira que eles
podem ter ao realizar o inventário de forma extrajudicial, muitas famílias
relevam pequenos desentendimentos, na busca por solucionar mais brevemente suas
questões patrimoniais, evitando-se assim desnecessários processos judiciais.
Além disso, não há razão
para impor a realização dos inventários de forma judicial quando, ainda que
haja interessados menores ou incapazes, todos estão de comum acordo, em
absoluto consenso. No fim, o resultado da partilha extrajudicial, atendendo aos
requisitos impostos pela Resolução 571/2024, resguarda os interesses do menor
ou incapaz da mesma forma protetiva que seria feita no judiciário, inclusive
com igual intervenção do Ministério Público.
Fonte:
Assessoria de Comunicação – CNB/RS